quinta-feira, 10 de setembro de 2009

Nanotecnologia - A Manipulação do Invisível

O que está por trás do desenvolvimento das novas tecnologias?

Para entendermos exatamente qual é o objetivo do desenvolvimento das novas tecnologias, bem como seus impactos no ambiente, na saúde humana, na economia e na sociedade, é extremamente importante compreender qual a origem e a finalidade de se desenvolver essas tecnologias.
Algumas perguntas são importantes de ser feitas: Quem desenvolve essas tecnologias? O que motiva o processo crescente de inovação tecnológica? Quais os interesses que estão por trás do desenvolvimento das novas tecnologias? Quem regula e impõe limites ao seu desenvolvimento?
Para compreender esse processo, é fundamental entendermos mais sobre o poder das grandes corporações no mundo de hoje. Segundo o cientista político Gilberto Dupas, a inovação tecnológica é o poderoso motor que movimenta as grandes corporações industriais globais. Desenvolver tecnologia é condição básica para garantir competitividade, reduzir custos e melhor aproveitar os fatores de produção (trabalho, capital, recursos naturais, conhecimento). Ou seja, as novas tecnologias não precisam ser socialmente úteis, tecnicamente superiores e/ou ambientalmente adequadas para ser desenvolvidas. O grande motivador é, sim, aumentar a eficiência e o lucro das empresas, pois é preciso inovar para poder “sobreviver” no mercado. Quem domina a tecnologia “determina” como o mercado vai funcionar e quais as novas tendências.
Assim, o desenvolvimento tecnológico é uma das principais condições para determinar a hegemonia das grandes corporações no mercado mundial e impor suas vontades aos governos locais e nacionais...

Há quem acredite ser possível utilizar a nanotecnologia para corrigir distorções sociais resultantes do próprio sistema capitalista. Mas, no atual modelo de sociedade em que vivemos, nenhuma tecnologia é capaz de resolver as injustiças existentes. E qualquer nova tecnologia introduzida numa sociedade não justa tende a aumentar ainda mais a diferença entre ricos e pobres. Os regimes de propriedade intelectual e os oligopólios de mercado, somados ao consentimento dos governos, normalmente têm dado um jeito de determinar quais tecnologias são adotadas e aos interesses de quem elas servem.

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Ao invés de discutir abertamente os riscos das novas tecnologias, os governos e as empresas trocam o diálogo por um controle maior. Com o pretexto das diferentes crises, do bioterrorismo e do caos climático, todos nos tornaremos suspeitos, e a diferença de opiniões políticas ou as alternativas de produção e de consumo passarão a ser crimes. As novas tecnologias não precisam funcionar para dar lucros. Uma ciência descuidada e umas tecnologias ruins podem ser rentáveis se os governos fazem leis adequadas a elas.

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No Brasil, o desenvolvimento da nanotecnologia está centralizado no Ministério de Ciência e Tecnologia, assim como estão as liberações dos transgênicos. Os órgãos da área de saúde e do meio ambiente estão praticamente de fora do que está ocorrendo nesses dois setores. De 2001 a 2006, o governo aplicou cerca de R$ 140 milhões no desenvolvimento da nanotecnologia. Apenas em torno de 0,06% desse total foram destinados para estudos de ética e de impactos sociais e ambientais. O Programa “Desenvolvimento da Nanociência e Nanotecnologia”, lançado em 2005 pelo governo brasileiro, visa aumentar a competitividade da indústria nacional. Nas 15 prioridades do Programa não consta nenhuma relativa à avaliação de riscos à saúde e ao ambiente. Embora o governo, os pesquisadores e a indústria enfatizem a importância da informação pública, na prática eles não reconhecem a legitimidade dos movimentos sociais e da sociedade civil de expressarem suas opiniões sobre as implicações e os potenciais riscos das nanotecnologias. Um comportamento similar ao que já ocorre em relação aos transgênicos.

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Enquanto a Europa considera proibir produtos nanotecnológicos na alimentação, no Brasil, segundo a Embrapa, a pesquisa e desenvolvimento da nanotecnologia aplicada à agricultura promete aumentar a qualidade e a competitividade da agroindústria nacional e da agricultura tropical, reduzindo custos e melhorando resultados. Mais uma vez, os lucros dos subsídios públicos serão privatizados enquanto danos à saúde e meio ambiente serão “socializados” entre a
população.

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Nano ração inteligente para frangos
Está sendo pesquisada uma ração para frangos com nanopartículas de poliestireno (o poliestireno expandido é o isopor), visando eliminar, do trato digestório, bactérias que provocam doenças, para não precisar usar antibióticos. Os pesquisadores esperam que as nanopartículas saiam no esterco, limpando as aves antes do abate. Mas isso não é tudo!
O objetivo de longo prazo dos pesquisadores é desenvolver nanopartículas desse tipo para tratar doenças humanas, especialmente diarréia, nos países em desenvolvimento. A pesquisa levanta uma série de questões ainda sem resposta: O que acontece com os trabalhadores que entram em contato com essas nanopartículas? E com as pessoas que comem esses animais? O que ocorre com essas nanopartículas uma vez excretadas no ambiente? Uma vez que o esterco de aves é usado como adubo, as nanopartículas vão atingir o solo e a água? Ao invés de atacar a raiz do modelo de produção industrial, estão desenvolvendo um remendo tecnológico com uso intensivo de capital, que tem o potencial de aumentar ainda mais a poluição agroindustrial. Vale lembrar que esse mesmo modelo industrial de produção já nos levou a graves epidemias, tais como a gripe aviária e a doença da vaca louca. Em relação à vaca louca, constatou-se, após meses de estudos, que foi justamente o tipo de ração utilizada que gerou o distúrbio nos animais. O que podemos esperar dessas novas super-rações e suas soluções fantasiosas?

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A percepção das agências governamentais de regulamentação é: Não há dados = não há problemas = o consumidor que se vire!

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A nanotecnologia aumenta muito as possibilidades do ser humano intervir na natureza, gerando potencialidades, mas também novos riscos. Infelizmente, mais uma vez, o interesse público está subordinado aos interesses das corporações e do capital, na presença de um Estado regulador retraído. É o legítimo salve-se quem puder!

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No dia a dia, é fundamental exigir informação sobre aquilo que consumimos. Produtos que nos gerem certa ‘estranheza’ em relação a suas propriedades e capacidades devem ser questionados; podemos contatar os SACs (Serviços de Atendimento aos Consumidores) para consultar se há presença de compostos nanotecnológicos nos produtos, exigir esclarecimentos por parte das empresas e, principalmente, questionar junto aos órgãos de defesa do consumidor a não rotulagem do produto. Se encontrarmos à venda produtos que afirmam possuir nanotecnologia, é extremamente importante recusar o seu consumo, pelo menos até se ter uma legislação clara e informações públicas a respeito. Para além do próprio desconhecimento dos impactos que possam trazer, o simples direito à informação sobre o que consumimos nos está sendo negado, sendo motivo suficiente para boicotar o consumo.

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A concentração empresarial, a imposição da tecnologia a qualquer custo, a degradação ambiental, a precarização das condições de trabalho, a mercantilização da alimentação e da saúde, não são resultados de uma “evolução natural” ou do “progresso inevitável” de nossa sociedade. São o resultado de decisões humanas, tomadas por pessoas e governos. Portanto, enfrentar essa realidade, rever prioridades, buscar alternativas, é algo plenamente possível e realizável. Entre todos, temos que lutar para estabelecer limites humanos para a ciência, pois quando ultrapassados, ao invés de entendimento e justiça, se promovem absurdos, desastres, riscos ao planeta e alienação política e social.
A partir da atitude de cada um e cada uma de nós, podemos buscar redesenhar relações de produção mais respeitosas com o ambiente, buscar redesenhar relações de trabalho mais valorizadoras do indivíduo e buscar redesenhar relações de consumo mais solidárias para com o(a) outro(a).

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